sábado, novembro 16

Um fato vem me intrigando desde que tirei o título de eleitor num longínquo passado. O caso é o seguinte: a seção onde eu voto localiza-se na escola que freqüentei do Jardim de infância ao C.A. Seria apenas uma grande coincidência ou a escolha é determinada justamente por esse tipo de vínculo? Adentrar suas dependências me desperta uma sensação de irrealidade. Parece que voltei no tempo. Exceção à parte dos fundos, que sofreu grandes alterações, o restante continua igual. Quando olho para o pátio as recordações surgem de forma inevitável. É o mesmo pátio sobre o qual rolei ao brigar com um menino mais velho (onde é que eu estava com a cabeça? E o que aquele brucutu estava fazendo no meio dos pirralhos?). O motivo da peleja me escapa, mas certamente foi algo muito grave (ahem). Mas lembro de ser premiado com um dente bambo, graças a um sopapo no meio da fuça, e de receber socorro médico da professora, tendo minha namoradinha ao lado. No intervalo entre as duas ações, provavelmente estava nocauteado. O episódio ao menos serviu para colocar um ponto final na minha carreira de valentão antes mesmo dela começar.
O lugar também foi palco de um dos momentos mais tragicômicos da minha infância. Após o encerramento das aulas sempre brincávamos nas redondezas do portão, aguardando que nossos pais viessem nos buscar. Certo dia, notei que o número de alunos retardatários diminuíra consideravelmente e comecei a me preocupar. Os minutos passaram e ficamos reduzidos a apenas dois. O jeito era buscar a solidariedade do meu companheiro de infortúnio. Porém, ele revelou-se um traíra e partiu, todo pimpão, de mãos dadas com sua mãe que acabara de chegar. A partir daquele momento eu estava sozinho. Rosto espremido entre as grades do portão, esperei, esperei e esperei (pois é, uma cena patética). A noite começou a cair, o horário de funcionamento da escola já se esgotara há muito. Os funcionários não sabiam o que fazer; ligaram para minha casa mas ninguém atendia. Demonstrando minha precoce tendência ao catastrofismo, deduzi o óbvio: meus pais tinham fugido da cidade às pressas e me deixaram para trás. Meu destino era o orfanato. Conformado, sequei as lágrimas e passei a especular sobre as chances de alguém vir a me adotar num futuro próximo. Concluí que eram bastante remotas. Ora, se nem os meus pais biológicos me queriam... Quando eu já me sentia mais rejeitado do que aquela primeira fatia que vem no saco de pão de fôrma, eis que surge no horizonte minha estimada genitora. Esbaforida, deu suas razões para o colossal atraso: estava na casa de uma amiga e ficou tão entretida com a conversa que nem lembrou-se de me buscar na escola. Apesar do motivo pouco lisonjeiro, terminei por compreender seu esquecimento. Afinal, eu nunca fui dotado de grande magnetismo pessoal.
Fico imaginando se na hora do recreio a cantina ainda vende aquelas garrafas de Crush e Grapette com o design clássico. Duvido muito. Things change... infelizmente.

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